Aprendi desde pequeno que “Homem como homem, vira lobisomem”. De onde tiraram isso? Fora a rima bizarra, o mais absurdo é que o lobisomem esteja associado ao homem homossexual. E, de acordo com a frase, para o homem “tornar-se” homossexual é necessário um “homem com homem”. Aos seis anos de idade eu já era um lobisomenzinho, mas meu “homem com homem” só rolou ali pelos 15. E aí?
VIRAR, TRANSFORMAR, MUDAR, TORNAR. São verbos que normalmente mostram uma transição, uma evolução. Mas nessa frase que a gente ouve desde criança o verbo serve apenas para mascarar preconceitos. Ninguém vira gay só porque resolveu explorar crateras alheias ou confrontar a espada de algum São Jorge. Existem gays virgens transbordando pelas salas de bate-papo, pelos barzinhos, pelos banheiros masculinos e vestiários das escolas. E o que os adultos preconceituosos ensinam para esses pequenos homens? Ensinam que, se eles virarem lobisomens, serão perseguidos por uma sociedade que tem medo de lobos.
Um professor me questionou porque eu fiz questão de colocar, em destaque, no meu trabalho de conclusão de curso, uma frase de autoria da filósofa Simone de Beauvoir: “Ninguém nasce mulher. Tornar-se mulher”. Acho que, sem querer, associei ao lance do lobisomem. Seguindo a mesma lógica, é possível dizer: “Ninguém nasce hetero. Torna-se hetero.” Desde pequenos somos obrigados a cumprir papéis de acordo com o que temos escondido nas fraldas.
Meninos formam filas de meninos para brincarem de carrinhos, serem violentos, líderes, competitivos e se ORGULHAREM de serem machos. Meninas formam filas de meninas para brincarem de bonecas, serem dóceis, recatadas, submissas e se CONFORMAREM em serem fêmeas. Fiz questão de usar os termos orgulho e conformação, pois é realmente isso que acontece. Não existe lua que clareie essa questão. Nascemos heteros? Nascemos bi? Nascemos gay? Sei apenas que nasci homem...
Nasci assim. Tão certo quanto a lua está acima das nossas cabeças, estava escrito nas estrelas que lobisomem eu viraria. Já dizia a profecia: homem com homem, dá lobisomem. Nasci lobi-baby, fui lobimoleque, agora estou entre lobi-boy e lobi-homem. A idade me fez lobisHomem. O "homem com homem" foi ironia do destino que começou numa videolocadora, entre comédias românticas e filmes de terror. Virei lobisomem, mesmo já tento nascido um.
Sou Lo-Bi-Boy. Meio espanhol por causa do Lo, meio inglês por causa do Boy. Mas o Bi é universal! Não importa a língua, a orientação sexual, o gênero, a identificação. Sou tudo isso misturado, bi, homo, hetero, dublado e legendado.
Torne-se. Ou pelo menos assuma.